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    A CONDENAÇÃO DE CLÉSIO SALVARO

    A manifestação do Juiz Luiz Antonio Zanini Fornerolli sobre o aluguel forjado das salas de Cléso Salvaro, no edifício Uno, centro de Criciúma.


    O deputado Clésio Salvaro, no afã de enriquecer-se ilicitamente, teria forjado a venda de duas salas comerciais suas (nºs 208 e 210 do Edifício Empresarial Uno, Rua João Pessoa, nº 445, Criciúma) para posteriormente alugá-las e assim ser indenizado pela ALESC.
    A instrução processual demonstrou que o réu praticou mais que um mero ilícito civil consistente na simulação de um negócio jurídico, especialmente porque induziu a Administração a despender recursos púbicos para fazer frente às suas ambições espúrias.
    A atitude do réu é condenável. O deputado valeu-se das benesses concedidas pelo Parlamento para praticar ato imoral, ilegal e lesivo aos cofres públicos, sendo que tudo há prova no processo.
    A compra e venda das salas comerciais de fato nunca existiu.
    Talvez a prova mais contundente é que o comprador Rafael Valvassori Bacis, à época do suposto negócio, tinha apenas 18 anos, era estudante e não tinha economia própria.
    A Receita Federal informou que Rafael, nos exercícios 1996 a 2000 não apresentou declarações e exercícios 2001 a 2004 declarou-se isento (fl. 188). Como então teria adquirido os imóveis-! E outra indagação: se efetivamente houvesse comprado imóveis estes teriam sido declarados ao Fisco no ano seguinte ao da compra, o que também não ocorreu.


    Não é só isso.
    O deputado Clésio Salvaro disse que o contrato inicialmente havia sido feio de forma verbal, por isso havia percebido aluguéis antes mesmo da formalização do contrato de compra e venda.
    Sinceramente, processualmente esse fato inexiste, pois dele o réu não fez prova. Inimaginável que uma pessoa minimamente instruída transacionasse a propriedade de um bem imóvel sem que o contrato fosse por instrumento público.
    O contrato particular de compra e venda com firma reconhecida em cartório, firmado posteriormente ao dito ajuste verbal, é demasiadamente frágil como meio de prova dos fatos articulados pela defesa, sendo vã tentativa do réu em dar aparência de veracidade à venda, afinal de contas, se o negócio houvesse ocorrido, o mais coerente seria o ajuste por meio de escritura pública.

    A escolha da pessoa de Rafael Valvassori Bacis foi conveniente para facilitar a concretização do objetivo do réu, pois aquele era cunhado de seu assessor de gabinete, proximidade esta que lhe asseguraria não só o sigilo da empreitada ilícita e seu êxito, como também a expectativa de que futuramente o apontado "comprador" não lhe exigiria o bem, pois se tudo fora forjado para obter proveito do Poder Público, que explicação daria o deputado se eventualmente tivesse que negar os direitos inerentes à propriedade ao tal comprador-!
    É notável, pelo que consta dos autos, a existência de ferrenha discórdia entre o autor Carlos Alberto Moyses e Clésio Salvaro, fato insistentemente anunciado pelo réu como modo de desqualificar a ação, imputando ao autor a pecha da litigância de má-fé.
    Isso não importa. Se realmente a tese defensiva procedesse e a ação não passasse de conspiração contra o réu, facilmente este poderia ter comprovado a maldosa litigância do autor, ao invés de tentar se esquivar da responsabilidade, trazendo documentos apenas relacionados com os problemas pessoais entre ambos. Nenhuma prova substanciosa acostou aos autos, tendo inclusive desistido da oitiva de algumas testemunhas.
    Justamente por ter assinado o contrato de compra e venda como testemunha e ter sido assessor do réu, isso confere ao autor uma certa credibilidade nas alegações, particularmente no que toca à falsa venda dos imóveis.
    Como por um certo momento fez parte da equipe do réu, o autor teve a oportunidade de saber sobre as condições pessoais de Rafael Valvassori Bacis e comprovar até mesmo sua insuficiência econômica para adquirir o bem.
    Ainda que o motim da ação tenha advindo de sentimento pessoal de vingança, o fato é que a versão narrada na inicial ficou comprovada no processo ao fim da instrução, demonstrando que a compra e venda foi simulada e que o deputado Clésio Salvaro não poderia receber os valores pagos pela ALESC.
    Diz o Código Civil em seu art. 167, caput e § 1º, que é nulo o negócio jurídico simulado, especificamente quando o ajuste aparentar conferir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem.
    É justamente o caso dos autos, onde a propriedade das salas nunca foi de Rafael Valvassori Bacis!
    Assim, o deputado Clésio Salvaro jamais poderia ter recebido verba indenizatória de imóveis que nunca alugou, pois os mesmos eram e permanecem seus, ao que até agora os autos indicam.

    Conclui-se, então, que os pagamento feitos pela Assembléia Legislativa a título de verba de extensão de gabinete ao réu Clésio Salvaro, no valor total de R$ 5.985,00, referente a nove meses de aluguel no valor de R$ 665,00 (fl. 189), de junho/2003 a fevereiro/2004, constituiu ato nulo por manifesto desvio de finalidade, servindo apenas de fonte de enriquecimento sem causa do réu Clésio Salvaro.
    Robustece a desonestidade do agente público a especial circunstância de que fez constar no falso contrato de locação apenas a sala 208, entretanto, a área informada no contrato de aluguel significa a soma das salas 208 e 210, demonstrando que o requerido justificou o preço do aluguel como se tratasse de uma sala maior.
    Enfim, o escopo era tirar maior proveito possível dos cofres públicos.
    Tocante ao desvio de finalidade, diz Celso Antônio Bandeira de Mello: "..O ato maculado deste vício direciona-se a um resultado diverso daquele ao qual teria de aportar ante o objetivo da norma habilitante. Há, então, um desvirtuamento do poder, pois o Poder Público, como de outra feita averbamos, falseia, deliberadamente ou não, com intuitos subalternos ou não, aquele seu dever de operar o estrito cumprimento do que se configuraria, ante o sentido da norma aplicanda, como o objetivo prezável e atingível pelo ato. Trata-se, pois, de um vício objetivo, pois o que importa não é se o agente pretendeu ou não discrepar da finalidade legal, mas se efetivamente dela discrepou." (Curso de Direito Administrativo. 25ª edição. 2008. p. 964)
    Além de ilegal, o pagamento dos aluguéis por solicitação do réu Clésio Salvaro gerou prejuízo econômico aos cofres públicos equivalente a R$ 5.985,00, em valores históricos, implicando no dever de indenizar as perdas e danos sofridas pelo erário.
    Prescreve o art. 2º, caput, "e", e art. 11, ambos da lei 4.717/65, o seguinte: São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:
    ....
    e) desvio de finalidade
    ...
    Art.11 A sentença que, julgando procedente a ação popular, decretar a invalidade do ato impugnado, condenará ao pagamento de perdas danos os responsáveis pela sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os funcionários causadores de dano, quando incorrerem em culpa.
    Ocioso, à conta de tudo o que foi visto, maiores discussões sobre o elemento subjetivo que integra o dever de indenizar.
    A conduta do réu foi manifestamente dolosa, fraudulenta e de má-fé. Também foi imoral e por tudo isso deve o réu ressarcir o numerário que indevidamente recebeu do Estado, identificados na fl. 189 por meio da seguinte tabela:

    Data pagamento
    NE OB Valor pago Mês referência/aluguel
    21/08/2003 3143 00801 665,00 Junho/03
    21/08/2003 3143 00801 665,00 Julho/03
    23/10/2003 4182 01050 665,00 Agosto/03
    03/12/2003 4710 01213 665,00 Setembro/03
    03/12/2003 4710 01213 665,00 Outubro/03
    17/12/2003 5142 01298 665,00 Novembro/03
    01/04/2004 953 00348 665,00 Dezembro/03
    01/04/2004 952 00348 665,00 Janeiro/04
    01/04/2004 952 00348 665,00 Fevereiro/04

    À luz do exposto, ACOLHO o pedido do autor para declarar nulos os pagamentos feitos pela Assembléia Legislativa de Santa Catarina a Clésio Salvaro a título de despesa com aluguel de escritório funcional, no período de junho de 2003 a fevereiro de 2004, totalizando R$ 5.985,00 (cinco mil reais, novecentos e oitenta e cinco reais) em valores históricos, condenado o réu a devolver os cofres públicos esta quantia recebida, devidamente atualizada.
    A correção monetária será pela Taxa SELIC a partir da data de cada pagamento até 29/06/2009. A partir do dia 30.06.2009, deverá ser feita na forma disposta no art. 1.º-F da Lei 9.494/97 com a redação dada pela Lei n.° 11.960/2009, conforme precedente do STJ no AgRg nos EmbExeMS 11819/DE, rel. Ministra Laurita Vaz.
    Condeno o réu, ainda a pagar as custas processuais e honorários advocatícios em favor do advogado do autor no valor de R$ 3.000,00.
    P. R. I.
    Florianópolis (SC), 08 de agosto de 2012.


    Luiz Antonio Zanini Fornerolli
    Juiz de Direito


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